Fim da reeleição reduz exercício do voto
Sob o pretexto de acabar com o instituto, PEC aprovada na CCJ do Senado reduz direito do eleitor a ir às urnas periodicamente

A Proposta de Emenda à Constituição 12/2022, que acaba com a reeleição, trará, se aprovada, uma outra implicação, bem mais complexa: a redução do exercício ao voto direto para apenas duas vezes a cada década, o que representaria um enfraquecimento de um dos pilares da democracia, o direito de o cidadão externar sua posição a respeito de partidos, políticas públicas e outras variáveis testadas nas eleições.
Há argumentos contrários e favoráveis ao fim da reeleição que são defensáveis jurídica, filosofica e empiricamente, depois da experiência de quase 30 anos em que o Brasil testa o instituto, desde a aprovação de outra PEC, em 1997 (sobre a qual, aliás, houve denúncias graves de compra de votos a favor).
Mas a proposta vai além e unifica as eleições para todos os cargos, espaçando-as para a cada cinco anos. Sob o argumento de economia e praticidade da coincidência de mandatos, se retira um dos principais termômetros para aferir a vontade e a satisfação do eleitorado, que é a repetição do ritual democrático de comparecer às urnas a cada dois anos.
Juristas lembram que a Constituição Federal estabelece como cláusula pétrea o voto periódico, na conformidade atual do processo democrático, que institui eleições a cada dois anos (art. 60, II da CF).
Há questões logísticas também subjacentes à discussão, como a dificuldade de a Justiça Eleitoral processar uma eleição tão extensa e a do eleitor escolher vereador, deputado estadual, deputado federal, três senadores, prefeito, governador e presidente da República de uma tacada só.
A chance de que o pleito municipal --de importância crucial para o dia a dia das pessoas, que, como diz a máxima, vivem nas cidades, e não na União-- ser absolutamente eclipsada pela disputa presidencial é enorme.
Há, por fim, a questão do financiamento: qual a chance de os deputados e senadores votarem a redução dos fundos eleitoral e partidário? Pelo contrário: sob o argumento de que serão muitos os cargos em disputa, o céu é o limite para o quanto vai se aprovar em termos de financiamento público para campanhas.
Além disso, tem-se que é praticamente impossível o aparelhamento da Justiça Eleitoral para a imprescindível jurisdição, tanto nos registros de candidaturas, quanto na fiscalização e garantia dos espaços na mídia para tantas campanhas e processos eleitorais concomitantes.
O atual sistema garante o necessário protagonismo das políticas locais próprias de cada município e imuniza este processo das influências dos pleitos de amplitude nacional, notadamente no quanto diz respeito ao poder econômico das campanhas nacionais.
Esse protagonismo das eleições municipais exclusivas garante a formação das lideranças locais e a consolidação das bases que sustentam o sistema democrático nacional. A unificação das eleições despreza o municipalismo e a desconcentração dos poderes, e deve refletir de forma negativa no atendimento das necessidades locais da população.
Em suma, a unificação das eleições eclipsará as eleições municipais em grande prejuízo para a democracia, que carece da formação de lideranças locais e maior proximidade dos eleitores com seus representantes mandatários.
Seria um grande retrocesso a aprovação desse projeto.
Fonte: Globo.com