Filho de Lula ressurge no futebol: 'ouvi desculpas por voto em Bolsonaro'

Filho de Lula ressurge no futebol: 'ouvi desculpas por voto em Bolsonaro'
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Luis Claudio Lula da Silva é diretor do Parintins-AM, clube fundado em 2021 e que, nesse ano, teve a melhor campanha da primeira fase do campeonato amazonense. Em entrevista ao UOL, ele conta como é a vida de um Lula no futebol. Porque, sim, Luís Claudio é filho do presidente da República.

Lulinha foi contratado pelo dono do clube, o empresário Sung Un Song, um antigo crítico do trabalho de Lula. Atuante no mercado de tecnologia, Song tem mais de 30 empresas pelo país, incluindo a produção de equipamentos na Zona Franca de Manaus.

"Eu estou hoje num emprego onde o meu chefe me contratou antes do meu pai sair da prisão. Foi uma pessoa que olhou no meu olho e falou assim: 'Cara eu votei no Bolsonaro e peço desculpas a você por ter feito isso, eu não sabia que esse cara era o que ele era. E eu tô te contratando não é por ser filho de quem você é, eu estou te contratando porque me recomendaram você, que você é competente."

  • O empresário também admitiu ter atuado pelo impeachment de Dilma Rousseff.

"Ele é muito aberto, ele falou assim, 'Luis, eu sou um dos empresários da Faria Lima, eu no momento da Dilma eu saí na rua pra protestar, fui na Paulista, votei nesse cara e aí dei conta, durante a pandemia, me dei conta de quem esse cara é."

  • Na última eleição Sung Un Song disse a Luis Claudio que votou em Lula para presidente.

Passagem pelos quatro grandes de São Paulo

Luís Cláudio trabalhou no São Paulo, Palmeiras, Santos e Corinthians e diz que não teve ajuda do pai em nenhum desses empregos.

"Nunca teve influência direta do meu pai. Agora, se as pessoas me contrataram por eu ser filho de quem eu sou, eu não tenho o que fazer. Eu vou, trabalho, mostro meu trabalho, você não vai conhecer uma pessoa que trabalhou comigo que possa reclamar de eu não trabalhar."

São Paulo: "O meu padrinho (de batismo, Roberto Teixeira) é sócio do clube Paulista e tinha alguns diretores do São Paulo na época que eram também sócios lá que eram amigos dele, de conviver no clube. E ele conseguiu essa vaga de estágio pra mim em Cotia. Eu fui pra lá e só num segundo momento souberam que eu era filho de quem eu era."

Palmeiras: "Todo mundo fala: 'você só foi pro Palmeiras, o Luxemburgo só te chamou porque você é filho do Lula'. Quem me apresentou ao Luxemburgo foi um cabeleireiro. Eu que o apresentei pro meu pai depois. O Vanderlei Nunes (cabeleireiro) me apresentou e falou 'o menino tá lá no São Paulo, trabalha pra caramba, ganharam tudo no sub-15, você não quer chamar ele'?"

Corinthians: "Quem me chamou foi o Mano Menezes porque esse mesmo cabeleireiro também cortava o cabelo do dele e falou 'olha, o menino quer continuar trabalhando em São Paulo, você consegue dar uma força pra ele?'", diz, ao ser questionado se a ida ao Corinthians não teve ligação com a amizade entre Lula e Andrés Sanchez, ex-presidente do Corinthians.

Santos: "Luxemburgo me chamou. Trabalhei com Neymar. Na época era um bom profissional. Claro que já tinha uma mídia em volta, todo mundo idolatrava o menino, então ele tinha uma soberba dele ali, mas nunca faltou com o respeito, nunca deixou de treinar, nunca deixou de fazer nada. O Vanderlei ficava, depois do treino, uma hora a mais com ele. Aí o Santos foi campeão, sem o Vanderlei, e na festa ele faz uma música contra o Vanderlei. O cara que esticou a mão para ele. Aí você vê o caráter da pessoa". Nota da redação: o episódio é de 2010. Em entrevistas posteriores, Neymar reconheceu que Luxemburgo foi importante em sua carreira.

"A hora que viram 'filho do Lula', esquece..."

Luís Claudio deixou o futebol no início da década passada para investir em futebol americano. Em parceria com o jornalista André José Adler, passou a administrar o torneio 'Touchdown'. Era o campeonato brasileiro de futebol americano, com 17 equipes de sete estados.

O campeonato conseguiu atrair patrocinadores e era televisionado em rede aberta. O fim da parceria aconteceu em 2015, quando Luis Claudio foi investigado na operação Zelotes.

"Era uma operação focada nos juízes do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), não tinha nada a ver com esporte. Pegaram um cliente, de um cliente, de um cliente, de um cliente que tinha um contrato comigo de projetos esportivos. E aí a hora que viram filho do Lula, esquece... Todos os bancos envolvidos que tinha nesse caso, montadoras de veículos, todos eles foram perdoados assim, menos de um ano. O processo que demorou mais foi o meu, que graças a Deus se encerrou."

Os patrocinadores passaram a evitar Luis Cláudio. "Eu ligava para o diretor de marketing, o cara com quem falava há quatro anos, me chamava de irmão e não atendia. Ou dizia: 'não, Luís, não posso falar agora'".

Luís Claudio tentou retornar ao esporte onde começou:

"Fui fazer o curso da CBF para licença B (treinador de base), mas parecia que eu tinha alguma doença transmissível, porque ninguém queria contratar. Elogiavam o currículo mas na hora de contratar falavam que não podiam com medo de perder patrocínio."

"Durante esse período eu cheguei a fazer bico em clube. Eu falava pros caras, não estou indo trabalhar especificamente pelo dinheiro, se quiser pagar o mínimo, eu quero estar na área. Porque eu confio muito no meu potencial e na minha capacidade, eu queria ter a oportunidade de mostrar para poder me estabilizar de novo."

Sem espaço no esporte, Luís Claudio foi trabalhar como assessor do deputado estadual Emídio de Souza (PT) na assembleia legislativa de São Paulo.

Luis Claudio só voltou ao futebol no Parintins, em 2021.

A prisão de Lula

Em abril de 2018 a rotina de Luís Claudio foi alterada com a prisão do pai. "Toda quinta, pegava o ônibus daqui de São Paulo, visitava meu pai e voltava. Na sexta, eu estava trabalhando. Eu nunca vi meu pai triste, eu nunca vi meu pai abatido, a gente se preparava pra chegar lá e ajudar ele emocionalmente, mas era ele quem dava suporte pra gente."

"Nesse período, eu falei assim: 'não é possível que as pessoas acreditem que o filho do Lula anda de Ferrari dourada, não é possível que o cara acredite que o filho do Lula é dono do Mato Grosso inteiro, de fazendas'. Eu tenho um (Ford) Ka 2007. Eu furei o pneu dele, fui trocar e postei: 'tô trocando aqui o pneu da minha Ferrari' e o pessoal começou a malhar, brincar pra caramba."
Luis Claudio, explicando por que resolveu mostrar o dia a dia nas redes sociais.

"Daqui a dois anos tem eleição de presidente. Meu pai vai fazer 79 com a saúde de um moleque de 20 e deve ser candidato novamente. Do jeito que tem saúde mental e saúde física, tem que ser candidato mesmo, não tem ninguém mais preparado que ele."

Apoio de Neymar e outros atletas do futebol a Bolsonaro

Principal estrela do futebol brasileiro, Neymar apoiou Jair Bolsonaro na eleição em que ele acabou derrotado pelo presidente Lula. Além dele, Robinho e Felipe Melo também declaram publicamente seus votos.

"Eu acho que não existe uma decepção. Eu acho que você pode ver pelo caráter do jogador que você já sabe mais ou menos pra onde ele vai. Desses que você citou (Neymar, Felipe Melo e Robinho) nenhuma decepção, zero, você já sabe o que vai vir dali. O jogador, a maioria, eles vivem numa grande bolha. Eles acham que tudo bem, que (já que) eles são aceitos na sociedade, o cara é negro, vem de periferia , ele (vai ser) aceito. Não é. A gente sabe que a verdade não é, você vai num colégio particular e tem 90% de brancos."

Luis Claudio também criticou Neymar por causa da relação com Luxemburgo. Os três trabalharam juntos no Santos.

"(Vanderlei) Ficava meia hora, quarenta minutos, uma hora a mais com ele. Aí depois o Santos foi campeão, o Vanderlei tinha saído e ele me vai pro palco da festa e faz uma música contra o Vanderlei. (...) Então você vê o caráter da pessoa."

Nota da redação: O episódio é de 2010, na comemoração do título paulista. Puxado por Robinho, um coro foi entoado pelos jogadores na festa, entre eles Neymar. "Ô Vanderlei pode esperar, a sua hora vai chegar'. A referência era o jogo entre Santos e Atlético-MG, que aconteceria dias depois pelas quartas de final da Copa do Brasil. O Santos venceu por 3 a 1. Neymar já reconheceu em entrevistas que Luxemburgo foi muito importante no seu começo de carreira.

Legado


"Eu cresci na sombra de um pai que é um monstro, é uma imagem gigantesca. Pô, as minhas filhas vão estudar meu pai nos livros de história. Meu sonho é deixar um legado para minhas filhas um dia falarem assim, 'olha, meu pai fez parte disso aqui ó, pequenininho, esse grãozinho de areia no futebol, mas fez!''

Ele terminou falando mais sobre ser filho de um personagem marcante na história do país:

"Filho do Lula: é um orgulho do caramba! Falam que a gente escolhe o pai quando está pra nascer, é o neném que escolhe a família que vai participar e eu tenho muito orgulho de estar nessa família. Eu tive um pai que me deu tudo de bom, de melhor na criação, minha mãe, não preciso nem falar... Se eu pudesse ela estava do meu lado aqui, dando entrevista comigo. Toda a história dele eu tenho muito orgulho. 'Ah, mas seu pai foi preso duas vezes'. Foi, duas vezes injustamente e as duas vezes ele saiu de lá melhor do que ele entrou."

Fonte: Uol